segunda-feira, 28 de outubro de 2013

IMAGINÁRIO DE UM AMOR

O piano transfere seus sons na noite às
Pombas,
E se escuta entre o vento tua voz, que nasce
Do nada,
E conversa com as flores.

Eu sinto a presença de teu alento arredor de
Minha consciência,
E penso durante longos séculos;
Para saber se teu halo
Traz alguma essência de amor.

O mar se mete entre meus sonhos
E se confundem tuas palavras
Com a brisa que provém do silêncio.

Caminho
Entre espaços
Submersos na memória de um concerto.

Parece que a sensibilidade quer voltar a nascer,
Mas um caracol detido no último milênio
Separa o tempo do contato.

Poderias dizer, talvez enviar-me um tanto de tuas
Emoções,
Desnudar o amor, reinventá-lo se estivesse morto.

O piano transferes os sons da noite às
Estrelas
E as estrelas desencadeiam uma chuva de mitos.
É música que penetra entre as rochas e a água,
E tudo se desvanece e volta a aparecer.

Quando não existe a verdade
E as formas são imagens iluminadas
Por uma razão em desvario,
O sonho se projeta no céu e se perde.

O sentido da vida é voltar a encontrá-la.


Gregorio Angelcos

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Gente

"Tem gente que é só passar pela gente que a gente fica contente. Tem gente que sente o que a gente sente e passa isto docemente. Tem gente que vive como a gente vive, tem gente que fala e nos olha na face, tem gente que cala e nos faz olhar. Toda essa gente que convive com a gente, leva da gente o que a gente teme passa a ser gente dentro da gente. Um pedaço da gente em outro alguém."


Fernando Sabino

domingo, 20 de outubro de 2013

Ideal

Aquela, que eu adoro, não é feita 
De lírios nem de rosas purpurinas, 
Não tem as formas languidas, divinas 
Da antiga Vénus de cintura estreita... 

Não é a Circe, cuja mão suspeita 
Compõe filtros mortaes entre ruinas, 
Nem a Amazona, que se agarra ás crinas 
D'um corcel e combate satisfeita... 

A mim mesmo pergunto, e não atino 
Com o nome que dê a essa visão, 
Que ora amostra ora esconde o meu destino... 

É como uma miragem, que entrevejo, 
Ideal, que nasceu na solidão, 
Nuvem, sonho impalpável do Desejo... 



Antero de Quental

domingo, 13 de outubro de 2013

A você, com amor

O amor é o murmúrio da terra 
quando as estrelas se apagam 
e os ventos da aurora vagam 
no nascimento do dia... 
O ridente abandono, 
a rútila alegria 
dos lábios, da fonte 
e da onda que arremete 
do mar... 

O amor é a memória 
que o tempo não mata, 
a canção bem-amada 
feliz e absurda... 

E a música inaudível... 

O silêncio que treme 
e parece ocupar 
o coração que freme 
quando a melodia 
do canto de um pássaro 
parece ficar... 

O amor é Deus em plenitude 
a infinita medida 
das dádivas que vêm 
com o sol e com a chuva 
seja na montanha 
seja na planura 
a chuva que corre 
e o tesouro armazenado 
no fim do arco-íris.



Vinicius de Moraes

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Vencido está de amor

Vencido está de amor Meu pensamento
O mais que pode ser Vencida a vida,
Sujeita a vos servir e Instituída,
Oferecendo tudo A vosso intento.

Contente deste bem, Louva o momento
Outra vez renovar Tão bem perdida;
A causa que me guia A tal ferida,
Ou hora em que se viu Seu perdimento.

Mil vezes desejando Está segura
Com essa pretensão Nesta empresa,
Tão estranha, tão doce, Honrosa e alta

Voltando só por vós Outra ventura,
Jurando não seguir Rara firmeza,
Sem ser no vosso amor Achado em falta.


Luís de Camões